Como exemplo, as flores enviadas pelo SBT aos funcionários demitidos geraram reações divididas, contrastando com a abordagem impessoal de empresas como Microsoft e Twitter

O SBT vive um momento de reestruturação que culminou em demissões em massa e trouxe à tona uma polêmica inesperada: os funcionários desligados receberam flores e uma carta como forma de despedida. Enquanto a medida foi considerada um gesto humanizado por alguns, outros a interpretaram como insensível e inadequada diante do impacto emocional de uma demissão. Marcos Tonin, especialista em RH, destacou o simbolismo e a complexidade dessa iniciativa em um contexto cultural marcado por fortes vínculos emocionais com o trabalho. Segundo Tonin, empresas familiares, como o SBT, enfrentam desafios únicos no processo de desligamento de funcionários. “A demissão em empresas familiares é frequentemente mais visceral. As pessoas desligadas muitas vezes saem com a sensação de serem vistas como ‘os bandidos da história’ e, em muitos casos, são tratadas como personas não gratas, o que é ainda mais delicado em organizações que se identificam com valores familiares.”

Ele ressalta que a abordagem do SBT pode ser vista como uma tentativa de trazer um novo olhar para o processo de desligamento. “Há uma tendência crescente no RH de tratar o desligamento com o mesmo cuidado que se tem na contratação. Assim como se faz integração e boas-vindas, o desligamento deveria seguir uma linha mais humanizada, com gratidão pelo tempo de contribuição e um reconhecimento formal.”

No entanto, Tonin aponta que essa prática, apesar de positiva no mundo corporativo, pode ser mal compreendida em um contexto popular. “Mandar embora com afetividade é um conceito de futuro, mas no Brasil, onde há fortes fatores emocionais ligados ao trabalho, isso pode parecer artificial ou insensível.”

Tonin ainda comenta que, no caso do SBT e de empresas familiares, “o discurso de que ‘somos todos uma família’ é em sua grande maioria disseminado no dia a dia dos colaboradores, em eventos e convenções de vendas, por exemplo. E como mandar um ‘membro da família’ embora? Esse é o desafio”.

Esse caso do SBT contrasta fortemente com a abordagem adotada por Elon Musk no Twitter, quando as demissões em massa foram conduzidas de forma impessoal e abrupta. Desde que Musk assumiu a plataforma, o Twitter cortou 80% de seus funcionários, reduzindo seu quadro de 7.500 para apenas 1.300 empregados. O processo foi marcado pela falta de comunicação e empatia, com muitos colaboradores perdendo acesso aos sistemas e aos escritórios sem aviso prévio. Enquanto alguns enxergam a decisão de Musk como uma tentativa de reestruturar a empresa para reduzir custos de forma agressiva, a falta de um processo mais humano gerou críticas, com ex-colaboradores e especialistas questionando a liderança de Musk. Ao contrário do gesto de flores do SBT, as demissões no Twitter foram vistas como desumanizadas, sem consideração pelos impactos emocionais e culturais, o que enfraqueceu a imagem de Musk e levantou dúvidas sobre o futuro da empresa. Assim, enquanto o SBT tentou demonstrar empatia, mas enfrentou resistência, o Twitter exemplifica o oposto, com uma abordagem fria e despersonalizada que gerou desconfiança pública e interna.

Além do caso do SBT, outros exemplos de demissões chamaram atenção ao redor do mundo. Em 2008, durante a crise financeira, a Zappos, empresa norte-americana conhecida por sua cultura organizacional única, ofereceu um pacote de demissão voluntária com um bônus de US$ 1.000, além dos benefícios tradicionais. A ideia era permitir que apenas funcionários verdadeiramente comprometidos permanecessem na empresa. A estratégia foi elogiada pela forma como lidou com o desligamento, mas também levantou debates sobre os limites entre incentivo e pressão. Outro exemplo notável ocorreu em 2014, quando a Microsoft anunciou a demissão de 18.000 funcionários por meio de um e-mail interno. A abordagem impessoal foi amplamente criticada e serviu de alerta sobre a necessidade de maior sensibilidade em desligamentos em larga escala.

Tonin também destaca que ações como as do SBT enfrentam desafios extras por conta da imagem forte e icônica de Silvio Santos. “A empresa carrega o peso de um legado. Qualquer decisão tomada pelas sucessoras do fundador, especialmente em momentos de crise, tende a ser vista com mais ceticismo e desconfiança pelo público.” A iniciativa de enviar flores, embora tenha sido uma tentativa de humanizar o desligamento, gerou um efeito contrário na opinião popular. “No imaginário popular, demitir com um gesto afetivo soa contraditório e muitas das vezes até sádico. O público tende a ver isso como algo insincero, o que pode acabar prejudicando a percepção da empresa. De fato, foi uma boa estratégia no papel, mas na prática, saiu pela culatra”, conclui Tonin.

O episódio do SBT reforça a necessidade de as empresas equilibrarem afetividade e efetividade em seus processos de desligamento, um desafio ainda maior em um cenário de crise e forte legado cultural.

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