*Roberta Rosenburg
Depois da pandemia, o mundo todo entrou em uma nova era de trabalho: uma em que as regras foram quebradas e o trabalho híbrido foi saudado como um arranjo perfeito que impulsionou o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Entretanto, o novo formato de trabalho resolve apenas uma parte das queixas mais comuns no mercado corporativo.
Se analisarmos de forma mais profunda, é possível identificarmos um paradoxo preocupante: mesmo com maior flexibilidade de horários e dias de trabalho, os casos de saúde mental estão aumentando. Sim, no novo mundo do trabalho, grande parte dos profissionais segue sofrendo de exaustão, depressão e outras comorbidades. Segundo a International Stress Management Association (ISMA), cerca de 30% dos trabalhadores brasileiros possuem sintomas de exaustão extrema, esgotamento e stress ligados ao ambiente profissional. O Brasil está em 2.º lugar no ranking mundial, atrás apenas do Japão.
Será então que os novos formatos de trabalho com mais flexibilidade não deveriam aumentar o bem-estar e a saúde dos profissionais?
Em parte, sim, mas não é somente isso. Em casos relacionados ao burnout, por exemplo, as organizações precisam ir além das soluções superficiais e implementar mudanças estruturais significativas, e para isso é necessário um diagnóstico.
Para se ter uma ideia, um relatório recente da Gallup, empresa de análise de dados e consultoria, aponta que os níveis de estresse entre os funcionários têm aumentado, principalmente entre os trabalhadores remotos e híbridos que, segundo o estudo, têm mais probabilidade de experimentar altos níveis de estresse do que os trabalhadores totalmente presenciais (43% e 45%, respectivamente, em comparação com 38%).
A verdade é que quer estejam trabalhando no sofá, em uma cafeteria ou no escritório, se o colaborador estiver se sentindo esgotado e desconectado do significado e do propósito do seu trabalho, e ele não estará motivado e continuará se sentindo esgotado.
É preciso ressaltar que, embora o trabalho híbrido e a flexibilidade sejam sim soluções para melhorar o equilíbrio entre vida profissional e pessoal, de acordo com um relatório da Deloitte essas abordagens, por si só, não são suficientes para resolver o problema. O estudo aponta que cerca de 40% dos empregados identificam o burnout como resultado direto da falta de apoio gerencial. Portanto, questões de saúde mental são um fenômeno complexo que vai além das questões estruturais do trabalho. Está também profundamente enraizado na qualidade do suporte oferecido pelos líderes e nas condições do ambiente de trabalho. A falta de reconhecimento, de apoio emocional e a sobrecarga são fatores críticos, independentemente do modelo de trabalho adotado.
De fato, o problema com o trabalho não é onde ele está acontecendo e é exatamente por isso que é crucial aprofundar a discussão e entender que a raiz do problema, muitas vezes, reside na falta de uma gestão eficiente e humanizada de pessoas.
Obviamente, flexibilizar o trabalho pode ser um fator positivo na saúde mental dos funcionários. Mas é a mudança na abordagem gerencial e na cultura organizacional que determinará a eficácia real na redução de casos de saúde mental e na construção de um ambiente de trabalho mais saudável e sustentável.
Isso implica alinhar os objetivos estratégicos da área, deixar claro quais os resultados tangíveis, realizar alinhamentos recorrentes, manter canais de comunicação abertos, em que os colaboradores se sintam à vontade para expressar seus pontos de vistas, preocupações e necessidades, bem como fornecer clareza de expectativas, quais são os resultados esperados e dar aos colaboradores autonomia sobre suas tarefas e horários, demonstrando confiança em suas capacidades, diminuindo as situações de stress e desconfortos.
Além disso, promover uma cultura organizacional que valorize o bem-estar e o desenvolvimento pessoal e profissional dos funcionários, conectando suas capacidades com o trabalho a ser realizado é também fundamental para se fomentar um ambiente inclusivo onde todos se sintam parte da equipe, independentemente de estarem trabalhando remotamente ou no escritório.
Investir em capacitação e em práticas que promovam, de fato, a saúde mental não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas também um fator estratégico para os novos líderes, que buscam melhores resultados. Afinal, uma força de trabalho saudável e motivada é essencial para impulsionar a inovação, a adaptabilidade e manter uma vantagem competitiva no mercado.
*Roberta Rosenburg possui mais de 25 anos de experiência no treinamento e desenvolvimento de pessoas. Tendo como foco a capacitação de lideranças, em sua trajetória profissional Roberta já desenvolveu e entregou projetos para mais de 100 empresas, tais como GSK, ExxonMobil, Unilever, Mercado Livre, Ball Corporation, Salesforce, Danone, Schlumberger, entre outras. Além disso, a CEO e cofundadora da F.Lead já impactou mais de 5 mil profissionais e já foi eleita uma das três melhores facilitadoras globais, entre mais de 350 profissionais da América Latina por uma consultoria sueca.